Mononucleose: a doença que derrubou Justin Bieber
Ela é importante devido à longa duração de seus sintomas, com incapacidade temporária e complicações com altos índices de severidade e óbito.
Infecção causada por diversos vírus (quando chamada síndrome da mononucleose, ou ‘mono-like’), mas especialmente pelo vírus Epstein-barr (EBV), quando chamada de doença mononucleose.
Ela é importante devido à longa duração de seus sintomas, com incapacidade temporária e complicações com altos índices de severidade e óbito.
O vírus EBV é um γ-herpesvirus extremamente comum ao redor do globo. Estima-se que aproximadamente 90% dos adultos adquirem anticorpos por
infecção adquirida antes dos 30 anos. A aquisição na tenra infância e a alta prevalência nessa faixa etária depende de fatores como hábitos sociais, nível socioeconômico, baixo nível educacional. Assim, não preciso dizer que é altamente prevalente no nosso país, especialmente nos rincões esquecidos pelas políticas públicas.
O vírus EBV é causa de 1% dos cânceres em todo o mundo, especialmente neoplasia linfoide (Linfoma de Burkitt, Linfoma de Hodgkin) e epitelióide como carcinoma de nasofaringe e gástrico. É responsável por 95% dos casos de Linfoma Burkitt, especialmente em locais em que a malária é comum, como na região amazônica.
A infecção pelo parasita Plasmodium falciparum induz a uma instabilidade genômica, predispondo células B a translocações em genes-chave, que é o
embrião dos linfomas. Em países subdesenvolvidos, o EBV é detectado em uma alta proporção de casos de Linfoma Hodgkin e em casos de esclerose múltipla.
Quanto mais cedo o contato com vírus, maior a probabilidade de desenvolvimento de neoplasia e doenças auto-imunes relacionadas ao EBV.
Especialmente num país latino, como o nosso, o contato íntimo é frequente, sendo que crianças pequenas adquirem o vírus através de contato íntimo (beijos na boca e rosto, compartilhamento de comida no mesmo talher) com seus pais e irmãos que carregam o vírus de forma assintomática nas secreções orais.
Inicialmente, o vírus alcança a mucosa oral e infecta o tecido linfóide da orofaringe e glândulas salivares, com posterior infecção dos linfócitos B.
Após, ocorre a latência por toda a vida do indivíduo, devido a imortalização da célula B que persiste com vigorosa proliferação em todo o corpo. Além disso, ocorre disseminação de novos vírus a partir da saliva, levando a persistência do DNA viral e o quadro de infecção latente.
Em adolescentes e adultos jovens, a principal forma de contágio é através do beijo. O sexo com penetração aumenta a possibilidade de transmissão, mas estudos demonstraram que o beijo profundo com ou sem coito tem o mesmo risco de infecção primária pelo EBV, demonstrando a importância da mucosa oral na transmissão viral.
Durante a infecção primária, a replicação viral é detectada primeiro na cavidade oral, nas tonsilas palatinas, atingindo a corrente sanguínea em 2 semanas, quando iniciam-se os sintomas e os anticorpos IgM são detectáveis.
O período de incubação da mononucleose é de aproximadamente 42 dias, ou seja, do contato até o aparecimento de sintomas, podendo variar de 30 a 50 dias.

O EBV costuma ser assintomático em crianças, e muito sintomático em adolescentes adultos.
Nos casos sintomáticos, o início abrupto de dor de garganta intensa (pus nas amígdalas em manto ao exame físico), desconforto cervical e na nuca (devido aumento dos linfonodos), fadiga extrema, dores musculares e mal-estar incapacitante. Os sintomas durante em média 10 dias, mas a fadiga e o desconforto cervical podem persistir por 3 semanas.
Outros sintomas menos comuns (20%) são dor abdominal, aumento do fígado (hepatomegalia), aumento do baço (esplenomegalia), náuseas e vômitos, lesões roxas (petéquias) no palato, inchaço ao redor dos olhos (edema periorbital) e palpebral e eritema (vermelhidão ou ‘rash’) em região torácica e abdominal. Com o uso de penicilina e derivados, pode ocorrer hipersensibilidade, e a frequência do rash é maior.
Um quadro de amigdalite bacteriana é muito semelhante a um quadro de mononucleose, sendo a prescrição de amoxicilina comum nesses casos.
Por isso, é muito comum a confusão do ‘rash’ da mononucleose com ‘alergia’ a amoxicilina, por exemplo.
Complicações sérias durante a fase aguda da infecção por EBV são raras (1%), sendo a ruptura esplênica a complicação mais temida, o que deixa atletas fora de competições por semanas.
A forma crônica do EBV é a cronificação da fase primária do EBV, que ocorre por meses, caracterizada por sinais por febre, linfadenopatia, esplenomegalia e hepatite. As complicações mais temidas são a Síndrome Hemofagocítica e a Sindrome Linfoproliferativa ligada ao X, caracterizadas por respostas celulares maciças à infecção primária por EBV, com simultânea incapacidade de controlar os linfócitos B infectados pelos vírus; ambas tem alta propensão de evolução para óbito se não controladas a tempo.
Não há uma vacina eficaz e segura disponível contra o EBV e não há tratamento específico.