Quem pode decretar o fim da pandemia?
Não há como negar que o cenário epidemiológico é favorável à retirada de algumas restrições, mas decretar o fim do estado de emergência tem consequências preocupantes do ponto de vista de saúde pública
No dia 18 de abril de 2022, o Ministério da Saúde anunciou o fim do estado de emergência por Covid-19, ou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin), surfando na onda de redução expressiva do número de casos proporcionada pela vacinação e impulsionado pelo ano eleitoral.
No entanto, de quem é a prerrogativa de anunciar o fim de uma pandemia que, por definição, tem âmbito internacional?
Claramente, e não somente por uma questão semântica, este anúncio só pode e poderá ser feito por uma organização multinacional, ou seja, a Organização Mundial de Saúde (OMS). E, nem ela, ainda não tem muita certeza sobre quando será o fim.
Não há como negar que (ainda bem) o cenário epidemiológico é favorável à retirada de algumas restrições tão necessárias durante os piores tempos da pandemia por SARS CoV2, mas decretar o fim do Espin tem consequências preocupantes do ponto de vista de saúde pública.
Essas consequências pairam na restrição à utilização de fármacos e imunizantes (vacinas) com status emergencial já implantados e a aprovação pela Conitec de novos, justamente na fase em que temos proeminentes esperanças de um tratamento precoce realmente efetivo (alguns com redução de risco acima de 90%).
Também trará impactos negativos na proteção às populações mais vulneráveis (idosos, super idosos, imunossuprimidos, gestantes), aquelas que apresentam resposta frustra ou até inexistente à vacinação, por meio de maior transmissibilidade viral pessoa a pessoa que a ausência de barreira facial (máscara) obrigatória promove, reduz a mobilização de servidores públicos e a rápida disponibilidade de leitos em hospitais em caso de novos surtos.
Em relação à postura em âmbito federal com o ‘anúncio’ feito pelo Ministério da Saúde, nada de novo. Tal ato compatibiliza com o praticado durante toda a pandemia, uma vez que nao houve restrição efetiva em nenhum momento e, sim, impedimento contínuo na aceitação das vacinas como a medida mais eficaz na contenção pandêmica (como vemos agora).
Além disso, inexistência de manuais norteadores das condutas preventivas e terapêuticas baseadas na melhor evidência científica disponível, estímulo ao uso de medicações ineficazes e potencialmente perigosas, disseminação do caos, posturas antagônicas em relação ao resto do mundo e, muitas vezes, dentro do próprio ministério, gerando angústias, incertezas e brigas políticas inconcebíveis.
O que era para ser a maior crise sanitária da história do país tornou-se uma crise política de proporções catastróficas.
E, ao contrário de admitir que a Ciência venceu, os protagonistas de todo esse circo tentam finalizar um capítulo, contando com a nossa memória curta, e albergando o papel de autoridade técnica no assunto, o qual nunca foi e nunca será seu.
A pandemia, como todo mal, um dia terá fim. Pois não há mal que dure para sempre. Apesar disso, não esqueçamos da Ciência, tão maculada e esquecida repetidamente durante toda a pandemia e até agora, neste momento de calmaria.
Somente a Ciência poderá nos dizer quando será o fim. Até lá, sigamos protegidos e conscientes.