Ruptura: lembranças, sonhos e o mundo corporativo
AppleTV+ entra na guerra dos streamings com uma das maiores surpresas do ano (até agora)
Netflix, Prime Video, HBO Max, Globoplay, Disney e Star Plus e Paramount Plus. Essas são as principais plataformas de streaming atuando no Brasil hoje. Cada vez mais com conteúdos próprios, tornando a vida do consumidor uma luta diária para saber em qual assinar, acompanhar e de fato, consumir.
A AppleTV+, talvez não seja muito difundida no Brasil, afinal, de todas, é a que chegou por último e trabalha muito pouco sua publicidade na divulgação de seus conteúdos. Provavelmente isso faz parte do contexto da Apple.
Apesar de um catálogo inferior aos seus concorrentes, em relação à quantidade, se tem algo que vale a pena acompanhar o streaming da maçã é a qualidade dos seus produtos. The Morning Show, Ted Lasso (já comentado aqui nesta coluna), Fundação, Servant, além de filmes como On The Rocks, Cherry – Inocência Perdida e Palmer comprovam que nem sempre quantidade é qualidade.
No dia 18 de fevereiro entrou uma nova produção no catálogo: Ruptura (Severance), série de ficção científica que teve a sua primeira temporada concluída.
Ruptura e um mundo utópico
Funcionários de uma empresa chamada Lumon cumprem seu horário de trabalho por oito horas. No entanto, enquanto trabalham, são programados para não lembrar de nada da vida pessoal. Enquanto isso, quando estão fora da empresa e voltam para a sua vida cotidiana, esquecem tudo que acontece no trabalho. Essa divisão é feita a partir de uma cirurgia, visando a produtividade dos funcionários. Mark S (Adam Scott) é um dos primeiros a ser cobaia do experimento. Quando seu amigo de escritório, Petey (Yul Vazquez), é demitido, ele começa a perceber a grande conspiração por trás daquela corporação.
Criada por Dan Erickson e dirigida por uma boa parte dos episódios por Ben Stiller, Ruptura é uma boa mistura de sci-fi, drama e suspense com uma boa dose de um universo utópico cheio de analogias do mundo real, digital através das redes sociais e o mundo corporativo que tanto nos afeta.
Dentro dessa premissa, que é algo quase que natural do nosso aspecto humano, separar os afazeres no trabalho da nossa vida pessoal, a série explora de forma programada as duas realidades, que apesar de distintas, fazem parte do processo pessoal. Afinal, o que nos torna humanos, é a nossa capacidade de armazenar e relacionar memórias, isso influencia diretamente em nossas relações e crescimento.
Ruptura traz um questionamento sobre o que nós somos sem a capacidade de armazenar nossas lembranças, ou melhor, se por algum momento, você tivesse esse controle de separá-las.
Minimalismo e equilíbrio
Além de questionamentos da percepção humana, a série trabalha uma imersão dentro desse universo e cria através dos personagens e cenários todo o contexto.
O elenco conta basicamente com quatro protagonistas: Mark Scout (Adam Scott), Dylan (Zach Cherry), Helly (Britt Lower) e Irving (John Turturro).
Eles trazem esse contexto corporativo, trabalham e seguem sua rotina juntos. Porém, ao passar de cada episódio, vão nos guiando através de cada desfecho. Afinal, se eles não podem “viver” fora da empresa, como eles podem saber se o que eles fazem é certo ou errado?
O destaque fica pela Helly, que é a última a entrar para o grupo e, assim como nós, vai descobrindo cada etapa da formação de um funcionário dentro da Lumen. Ela se torna a nossa guia através da interpretação da Britt Lower, esse quase clichê da novata que questiona tudo que acontece em sua volta.
Com cenários criativos fazendo uma alusão a empresas da década de 70, mas ao mesmo tempo com uma tecnologia que flutua em uma parte automática, sensores modernos, mas com funcionários utilizando máquinas fotográficas antigas. Causando estranheza e ao mesmo tempo, um olhar extremamente opressor, causando certa claustrofobia.
Misturando atuações, cenários e uma direção absurda do nosso querido Ben Stiller, que vem se destacando positivamente como diretor, a exemplo do excelente A Vida Secreta de Walter Mitty, de 2013. E com uma trilha sonora composta por por Theodore Shapiro, trazendo uma sonoridade minimalista, lembrando composições de Philip Glass e Atticus Ross.
Ruptura é uma soma de todos esses elementos: produção excelente com atuações carismáticas e uma história que deixa o espectador cada vez mais confuso, mas ao mesmo tempo, na expectativa de descobrir o desfecho.
A primeira temporada de Ruptura está completa na AppleTV+ e a segunda temporada já foi anunciada, mas sem previsão de lançamento.
Confira o trailer: